segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

NOS PASSOS DE PESSOA III E ESTEFÂNIA - 20 de janeiro de 2014


Comecei o meu dia participando da missa na Igreja de São Domingos. Dali me dirigi para os lados da Mouraria e da Praça Martim Moni a fim de seguir até o bairro de Estefânia, continuando a visita aos locais nos quais o poeta Fernando Pessoa viveu ou trabalhou.
Na Praça da Figueira deparei-me com um homem com algumas malas e que parecia estar sem abrigo. Abordou-me, perguntando-me se falava inglês e eu respondi que não; espanhol?, também disse que não, só português. Ele então foi-me dizendo numa mistura de inglês, espanhol e português que queria dinheiro para comer. Não tenho o hábito de dar dinheiro, ainda mais na rua, com receio de que este seja utilizado para drogas. E eu lhe disse que dinheiro eu não daria, mas comida sim. Ele estava em frente a uma pastelaria e restaurante (pastelaria aqui não é como a conhecemos no Brasil, pois pastéis em Portugal são doces, tipo Pastéis de Belém ou de Nata, ou o de Santa Clara) e o convidei para comer algo lá. Pedi para escolher, oferecendo-lhe um sande (sanduíche), mas ele optou por sopa. Refrigerante? Preferiu café-com-leite. Pedi para ele ainda um sande de frango, paguei a conta e deixei-o lá matando a sua fome que parecia bem real. No final deste meu dia, senti que fui recompensado.
Chegando ao ponto de meu roteiro pessoano de onde eu havia parado na véspera, fui visitando os endereços em que Fernando Pessoa morou na região de Estefânia e logo após o primeiro endereço passei pelo hospital Dona Estefânia, situado na rua Jacinta Marto. Sobre este hospital, falarei mais adiante.
Almocei em um restaurante na rua Passos Manuel, na qual Fernando Pessoa morou durante um período e retornei para o hotel atravessando a praça do Campo dos Mártires da Pátria, pela qual havia passado no dia anterior, cortando assim caminho até o hotel. Descansei meus pés por meia hora e fui procurar a casa onde morreu Camões no século XVI. Ao lado da Igreja do Franceses, onde participei da missa no último domingo, há uma longa escadaria que foi de fato muito mais longa do que eu esperava. Dezenas e dezenas de degraus, que continuava a cada curva que havia. Finalmente cheguei ao topo e logo à frente encontrei a Calçada de Santana. Na primeira casa à direita há uma construção antiga e simples com uma lápide indicando ser ali o local onde Camões teria morrido. Sobre isso, também mais abaixo falarei.
Desci a Calçada de Santana, rua estreita e sinuosa, que termina no Largo de São Domingos. Logo após a suposta casa de Camões, em uma viela encontrei outra lápide indicando a casa de nascimento de Amália Rodrigues, a mais famosa fadista de Portugal e do mundo. Dali segui para o Chiado a fim de encontrar uma determinada purpurina que me foi pedida pelas nossas queridas Irmãs Clarissas.
Retornando ao hotel, comecei a trabalhar nas fotos do dia para postar aqui no blog, já pronto para dormir, embora fosse ainda 20h00, quando toca o telefone. O sr. Manuel Madeira, sacristão da Ermida e da Igreja de São José estava embaixo na portaria. Desci feliz pela visita desse amigo que aqui fiz e, após uma breve conversa na sala de estar ao fundo do térreo do hotel, ele levou-me a jantar uma bacalhoada cozida com grãos no pequeno restaurante perto da igreja, que ele me havia apresentado dias antes. Conversamos longamente sobre assuntos ligados à fé e à igreja, e por volta das 23h00 subi para meu quarto e dormi em seguida.

 o Mercado da Praça da Figueira, meu mercado preferido para frutas
 entrada do Mercado da Praça da Figueira
 um dragão chinês na Praça Martim Moniz


 rua Passos Manuel, 24
Fernando Pessoa viveu aqui com a sua Tia Anica, entre 1912 e 1914




Na rua Jacinta Marto, em Estefânia, fica o Hospital Dona Estefânia, no qual a pequena vidente de Fátima, Jacinta Marto, morreu em 1920.
Em maio de 2012 eu estava caminhando por essa rua, já cansado de tanto andar. Subi a ladeira seguindo em direção à Praça Marquês de Pombal, que era uma referência de localização. Passei por um hospital, que não me chamou a atenção, e quando cheguei ao final da rua vi uma placa com o nome: Jacinta Marto. Na mesma hora minha mente estabeleceu a relação: rua Jacinta Marto - Jacinta morreu em um hospital em Lisboa - este deve ser o hospital. Mesmo cansado, desci a rua até a entrada do hospital e perguntei a uma mulher que estava na portaria se fora naquele hospital que a vidente de Fátima havia morrido. Ela respondeu-me que não. Diante da minha insistência, relatando a ela a relação que eu havia estabelecido entre o nome da rua e o hospital, ela então me disse que havia de fato alguma coisa escrita no corredor do primeiro andar. E deixou-me entrar sem problema algum. Ante a dificuldade que há no Brasil para se entrar em qualquer hospital, fiquei admirado com a falta de burocracia. Hoje, quando voltei a este hospital, entrei sem dificuldade alguma.
No primeiro andar, há algumas portas de uma antiga enfermaria que não funciona mais. Na parede há fotos que marcam a passagem de Jacinta pelo hospital. Em 2012, após visitar o primeiro andar, vi pelas fotos que o corpo de Jacinta passara pela capela do hospital e que havia depois sido levado para a Igreja de Nossa Senhora dos Anjos para missa de corpo presente. Desta vez, já de posse destas informações, passei primeiro pela igreja (postagem de ontem), e hoje fui primeiro visitar a capela e em seguida subi ao primeiro andar.
Antes das fotos, algumas informações históricas a respeito de Jacinta.
Jacinta Marto nasceu no dia 11 de março de 1910 em Aljustrel, Fátima (há fotos de sua casa na postagem do dia 16). No dia 23 de dezembro de 1918, ela e seu irmão Francisco adoecem, vítimas de "pneumônica". Francisco morre em sua casa no dia 04 de abril de 1919 (há fotos do quarto em que morreu Francisco na postagem do dia 16). No dia 21 de janeiro de 1920, Jacinta é levada para Lisboa, onde fica internada no Orfanato de Nossa Senhora dos Milagres, na Rua da Estrela, nº 17. No dia 2 de Fevereiro de 1920 é levada para o Hospital de Don Estefânia. Morre neste hospital no dia 20 de fevereiro do mesmo ano. 
. Na Wikipedia lê-se: "As três crianças, mas particularmente Jacinta, praticavam mortificações e penitências. É possível que prolongados jejuns a tenham enfraquecido ao ponto de ter sucumbido à epidemia do vírus influenza que varreu a Europa em 1918 e em consequência da Primeira Guerra Mundial. Jacinta, que sofria de pleurisia e não podia ser anestesiada devido à má condição do seu coração, foi assistida em vários hospitais, acabando por sucumbir em 20 de fevereiro de 1920, no Hospital D. Estefânia em Lisboa."
Como foi dito acima, no dia 23 de Dezembro de 1918 Francisco e Jacinta adoeceram ao mesmo tempo. Indo visitá-los, Lúcia encontrou Jacinta no auge da alegria. Na sua Primeira Memória, Lúcia conta: "Um dia mandou-me chamar: que fosse junto dela depressa. Lá fui, correndo. – Nossa Senhora veio-nos ver e diz que vem buscar o Francisco muito breve para o Céu. E a mim perguntou-me se queria ainda converter mais pecadores. Disse-Lhe que sim. Disse-me que ia para um hospital, que lá sofreria muito; que sofresse pela conversão dos pecadores, em reparação dos pecados contra o Imaculado Coração de Maria e por amor de Jesus. Perguntei se tu ias comigo. Disse que não. Isto é o que me custa mais. Disse que ia minha mãe levar-me e, depois, fico lá sozinha! Em fins de Dezembro de 1919, de novo a Santíssima Virgem se dignou visitar a Jacinta, para lhe anunciar novas cruzes e sacrifícios. Deu-me a notícia e dizia-me: – Disse-me que vou para Lisboa, para outro hospital; que não te torno a ver, nem os meus pais; que, depois de sofrer muito, morro sozinha, mas que não tenha medo; que me vai lá Ela buscar para o Céu. Durante a sua permanência de 18 dias no hospital em Lisboa, Jacinta foi favorecida com novas visitas de Nossa Senhora, que lhe anunciou o dia e a hora em que haveria de morrer. Quatro dias antes de a levar para o Céu, a Santíssima Virgem tirou-lhe todas as dores. Nas vésperas da sua morte, alguém lhe perguntou se queria ver a mãe, ao que ela respondeu:  A minha família durará pouco tempo e em breve se encontrarão no Céu… Nossa Senhora aparecerá outra vez, mas não a mim, porque com certeza morro, como Ela me disse".


 Hospital Dona Estefânia

 memorial em frente à capela do  Hospital Dona Estefânia
 foto dos pais de Jacinta
 foto da igreja da aldeia, onde Jacinta foi batizada
 foto da pia batismal
 registro do batismo de Jacinta, com anotação, ao lado, de sua morte
 entrada da capela do  Hospital Dona Estefânia, no térreo
 lápide na parede ao lado da capela do Hospital Dona Estefânia

 foto de Francisco na parede direita externa à capela do Hospital Dona Estefânia
 foto dos videntes na Cova da Iria
 o videntes em frente à igreja paroqual
 foto da família de Jacinta
 Jacinta e Lúcia em 1917
 capela do  Hospital Dona Estefânia

 o livro de visitas à capela do Hospital Dona Estefânia
 fotos e portas da enfermaria na qual morreu Jacinta, no  Hospital Dona Estefânia





 o registro de óbito de Jacinta

foto extraída da internet com o registro de Jacinta no Hospital Dona Estefânia


 fotos ao lado direito das portas da enfermaria em que Jacinta morreu 
 foto do Dr. Eurico Lisboa, que tratou de Jacinta
 foto da diretora do hospital à época da internação de Jacinta
 foto do hospital
 foto das enfermeiras que cuidaram de Jacinta, Leonor da Assunção e Aurora da Costa Gomes
 foto do sr. Fernandes, funcionário do hospital, que levou Jacinta para a sala de operações 
 placa comemorativa à passagem da Beata Jacinta pelo Hospital Dona Estefânia
 jardim do hospital

 entrada principal do Hospital Dona Estefânia, vista da rua Jacinta Marto

 uma porta encimada por azulejaria com imagem do poeta Luís de Camões e verso d'Os Lusíadas
 detalhe da azulejaria
 o verso às Tàgides


SONETO

Andava eu nas ruas de Lisboa
cruzando a cidade à procura
de inspiração poética - loucura! -
seguindo os passos do luso Pessoa.

Em certa rua, com a mente à toa,
inesperadamente se afigura
em azulejo tão bela gravura:
às Tágides Camões cantando loa.

Quedei-me embevecido a admirar
a arte em azulejo e a poesia
revelando o engenho lusitano.

Entorpecido pus-me a clamar
o mesmo engenho que a Camões ardia
às Tágides a mim, estulto humano.


rua Bernardim Ribeiro, 17
Fernando Pessoa morou no primeira andar desta casa entre 1917 e 1919 



um lindo edifício com fachada em azulejos e sacadas em ferro
rua de Dona Estefânia, 127
Fernando Pessoa morou no térreo à esquerda, em um quarto alugado, entre 1914 e 1916



um chafariz no Largo de Dona Estefânia

rua Almirante Barroso, 12
Fernando Pessoa morou em uma quarto alugado na sobreloja da Leitaria Alentejana, por alguns meses em 1916
o número e o prédio não existem
no local há um edifício moderno do Crédito Agrícola

busto do poeta Cesário Verde na Praça da Ilha do Faial



rua Cidade da Horta, 58 
Nesta casa, do sr. Songo, Fernando Pessoa viveu em um quarto alugado no primeiro andar à direita, entre 1916 e 1917



Praça Dona Estefânia
rua Pascoal de Melo, 119
Fernando Pessoa viveu aqui alguns meses de 1914, no terceiro andar à direita



parada em uma praça na rua Passoa Manuel
Campo dos Mártires da Pátria
Campo dos Mártires da Pátria
Campo dos Mártires da Pátria
Campo dos Mártires da Pátria, com  Faculdade de Medicina de Lisboa ao fundo
Campo dos Mártires da Pátria
uma vista do rio Tejo, Elevador Santa Justa e Ruínas do Carmo a partir da escadaria atrás da igreja de São Luís dos Franceses

Há uma tradição de que o poeta Luís de Camões, autor d'Os Lusíadas, teria morrido nesta casa na Calçada de Santana, número 139, a partir de uma obra do Visconde de Jurumenha, editada em 1853, que por sua vez baseou-se em uma biografia manuscrita de Camões  de autoria do padre Francisco de Santo Agostinho de Macedo, que afirmou que "Camões morrera numa casa humilda na rua de Sant'Ana junto ao arco de mesma denominação e casa (convento) da Encarnação, e pegada com a Ermida do Senhor Jesus da Salvação e Paz no lado ocidental da atual calçada", tratando-se portanto do prédio que então tinha os números 52 e 54, e era o segundo a contar das Escadinhas de São Luís, e contíguo ao da lápide. Mas o proprietário do imóvel onde está afixada a lápide, Manuel José Correia, talvez querendo valorizar o seu imóvel e chamar a atenção para o seu prédio, em 1867 mandou fixar na fachada desse imóvel a placa na qual se lê que o poeta ali teria morrido. Em um livro do século XVII, de Manuel de Faria e Sousa, consta que Camões viveu junto à Igreja de Santana e que ele morreu na pobre casa em que vivia próxima ao convento das Mojas Franciscanas. Outras edições vão falando a respeito da casa onde morreu Camões, mas nada é certo. Sendo assim, já que o poeta morou e morreu provavelmente naquela rua ou imediações, a lápida afixada na casa serve ao menos como curiosidade.
casa onde supostamente morreu Camões


o Tejo visto ao longe
casa onde nasceu Amália Rodrigues na rua de Martim Vaz



Praça da Figueira - D. João I com Castelo de São Jorge ao fundo

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